📸🎸✈️ Fotografia, Música e Viagens: o Despertar de Uma Jornada
O despertar de quem decidiu transformar o som da própria vida em movimento.


Introdução
Em 2017, minha vida parecia estável. Trabalho fixo, rotina organizada, segurança financeira. Mas, por dentro, havia um vazio. Foi então que a música da minha adolescência, a paixão adormecida pela fotografia e a decisão de viajar mundo afora se reuniram. Esta é a história de como uma guitarra, uma cidade e um show deram novas perspectivas à minha vida.
Um cotidiano sem cor
Em 2017 eu estava morando em Palhoça e trabalhava em São José, na Grande Florianópolis. Todo dia encarava um trânsito absurdamente caótico, desses que adoecem só de existir. Minha vida era estável profissionalmente, mas sem alma. Eu vivia no automático — uma rotina que me anestesiava. Faltava cor, faltava sentido.
Minha autoestima estava em baixa. Eu me sentia aquém do que poderia ser, como se minhas conquistas não estivessem à altura da vida que eu sonhava. Era como se houvesse um fosso entre a vida que eu levava e a vida que eu desejava viver.
Eu me enxergava como coadjuvante da minha própria história.
Havia segurança, mas não grandeza. Dias cinzentos, repetidos, nos quais eu cumpria tarefas sem deixar marcas. Faltava aquela sensação de estar vivendo uma vida que valesse ser contada. Era como se eu tivesse acumulado passos, mas não jornadas; como se tivesse atravessado anos, mas não pavimentando caminhos.


Não era depressão: havia momentos de entusiasmo, pequenas alegrias, mas eram faíscas breves, incapazes de iluminar por inteiro a escuridão morna em que eu caminhava.
Sempre fui autocrítico. Racional demais para me deixar levar, sensível o bastante para sentir que faltava algo. Meu olhar buscava lógica e ordem; meu coração pedia intensidade e beleza. Essa contradição, que tantas vezes me impulsionou, naquele período pesava.
Eu olhava para números, diplomas, conquistas — e ainda assim havia uma voz silenciosa dizendo que aquilo não bastava. Talvez porque, no fundo, eu nunca me satisfiz com o “suficiente”. Minha natureza inquieta sempre me empurrou para além do que já estava ao meu alcance. A estabilidade era confortável, mas para mim conforto nunca foi sinônimo de realização.
Não buscava ostentação, o que sempre desprezei. Buscava sentido. Era como se carregasse dentro de mim um apetite pelo extraordinário — um chamado para viver algo maior, autêntico e transformador, e não apenas o trivial.
No fundo, eu sabia: não era a ausência de realizações externas que me incomodava, mas a sensação de que minha essência — esse misto de razão crítica e sensibilidade estética — ainda não tinha encontrado um espaço pleno para florescer.
E o vazio continuava ali. Não era uma dor exposta, mas um silêncio corrosivo por dentro. Eu sentia que havia algo em mim pedindo para despertar, mas ainda não sabia qual seria o primeiro passo.
Foi nesse contexto que percebi: eu precisava de ruptura, de um abalo. Aos 37 anos, minha experiência internacional era quase nula. Além de uma ida à Argentina, o mais longe que havia chegado eram passagens rápidas por Ciudad del Este, no Paraguai (que nem conta como viagem internacional, não é mesmo?).
Eram apenas escapadas rápidas incapazes de me dar a sensação de atravessar fronteiras de verdade, geográficas ou internas.
Na adolescência, porém, eu já carregava uma chama que nunca se apagou: a música, especialmente o rock. Esse gênero não era apenas um som: era linguagem de rebeldia, de crítica, de liberdade.
A voz de uma geração que queria quebrar correntes. E, para mim, essa voz tinha nome e imagem: Slash, sua cartola, sua postura inconfundível, os solos que uniam fúria e poesia.
O chamado para atravessar fronteiras


Show do Guns N' Roses em Floripa - setembro/22
O impacto do Guns N’ Roses
Lembrei do meu primeiro contato com o Guns N’ Roses, ainda em meados dos anos 90, assistindo em VHS ao histórico show da Use Your Illusion World Tour em Tóquio, gravado em 1992. Aquelas músicas e performance explodiram dentro de mim como uma revelação: riffs magnéticos, energia crua, quase indomável. Para um garoto em formação, tudo aquilo fazia sentido — a rebeldia, o excesso, o comportamento autodestrutivo da banda que eu romantizava como sinônimo de liberdade e subversão (do alto dos meus 15/16 anos). Essa paixão cresceu comigo até se transformar em parte da minha identidade, em certa medida.
Cresci fascinado por aquele estilo, e a Gibson Les Paul do Slash virou para mim mais do que um instrumento: era objeto de desejo, um símbolo de identidade, um sonho guardado por décadas.


Foto do homem idealizador da mítica guitarra que leva seu nome. Essa foto de Les Paul está localizada no famosíssimo teatro nova-iorquino Carnigie Hall
Então, quando decidi minha primeira grande viagem, a resposta foi natural: por que não começar pela “capital do mundo”? Nova York.




Não era apenas um ponto no mapa. Era um palco do mundo. Cenários icônicos, filmes, canções — registros inesquecíveis à espera. Um lugar onde eu poderia me perder entre multidões e, paradoxalmente, me reencontrar. E ainda realizar aquele sonho juvenil amadurecido: comprar a minha própria Gibson Les Paul.
A viagem não teria cara de fuga adolescente, mas o rosto de um homem que escolhe ser protagonista. Não seria uma corrida para negar a vida que eu tinha, mas um movimento consciente para expandi-la.
Com seus lugares emblemáticos e sua energia inesgotável:
Nova York: o rito de passagem
Nova York seria meu rito de passagem: a chance de atravessar não apenas fronteiras geográficas, mas os limites invisíveis que eu mesmo havia imposto à minha história.
Primeiros sinais do despertar
Lembro da euforia ao pisar na cidade. Não era um desembarque; era atravessar um portal. Até o shuttle do JFK que leva ao metrô me parecia cinematográfico. Havia algo de mágico em ouvir o inglês dos alto-falantes, a cadência acelerada das instruções conhecidas apenas dos filmes.
No metrô rumo ao Brooklyn, ouvi a frase dos altos falantes da composição, que até hoje ecoa de forma musical quando lembro dela: “Stand clear of the closing doors, please”, seguido do ding dong. A voz ressoava pelo vagão como se viesse direto de uma sala de cinema, e só de ouvi-la ativa uma série de memórias de NYC.
Para mim, era como uma senha, um aviso simbólico:
As portas se fechavam atrás; o novo me puxava adiante.










O ranger dos trilhos, o mosaico de rostos apressados, os letreiros iluminados — tudo era confirmação: Nova York não era mais fantasia. Era real. Era tangível. Era agora. E eu fazia parte daquela cena.
A fotografia: da aspiração ao OLHAR
Outra chama antiga também se reacendeu: a fotografia. Até então, eu era apenas um amador perdido entre fascínios e curiosidades. Sabia especificações técnicas, mas não lia a luz. Admirava câmeras, mas não compreendia a alma da fotografia.
Passei anos em reviews e comparações, encantado com cada novo modelo. Hoje, olhando em retrospectiva, percebo que dedicava mais energia às aspirações do que às vivências. Sonhava mais com a câmera perfeita, a tecnologia embutida, do que com a fotografia perfeita. Conhecia números, mas não poesia.
Foi então que a fotografia começou a deixar de ser apenas um hobby efêmero, e passou a se insinuar como caminho. Eu percebi que não bastava admirar a tecnologia, ou a técnica dos outros — Era preciso mergulhar na minha própria forma de ver o mundo.
Essa frustração não me desanimava. Acendia em mim uma inquietação nova. E Nova York me dizia,
em cada rua e cada luz: se quiser transformar memórias em arte, aprenda a olhar de verdade.

Guitar Center: o altar da música
Chegar à Guitar Center - Times Square foi como entrar em um templo. Logo na entrada, uma escada rolante me conduzia ao subsolo. Paredes tomadas por cores vibrantes, pôsteres e referências a shows lendários, como se cada centímetro fosse um tributo à música.
Durante a descida da escada rolante, um telão à frente dos olhos projetava imagens de uma plateia pulsante em um grande concerto de rock, dando a perspectiva de quem entra na loja de estar em cima de um palco, se apresentando a uma multidão.
O coração acelerava. O corpo respondia em descargas de adrenalina. A euforia era tão real que parecia possível sentir a energia daquela multidão. A Guitar Center não era apenas uma loja: era uma experiência cuidadosamente criada para que cada visitante sentisse o que era viver a música.
No subsolo, o impacto foi imediato: fileiras de guitarras erguiam-se nas paredes como relíquias sagradas. Cada instrumento parecia carregar uma história, cada modelo um universo. Caminhar por aquele corredor de sonhos era como estar diante de um altar.
E então, ela: a Les Paul Tribute. Meus olhos brilharam como os de um adolescente diante do impossível. A guitarra que, desde a adolescência, simbolizava para mim muito mais do que um instrumento. Era um objeto de desejo, um pedaço da identidade que eu havia sonhado conquistar.
Quando a segurei nos braços, eu voltei no tempo. O peso sólido do mogno, o brilho fosco do acabamento, o timbre encorpado que ecoou no primeiro acorde — tudo aquilo era como um batismo.
Quando saí da loja com a Gibson nos braços, eu sabia: não era só uma guitarra.


Philadelphia: o reencontro
E então veio a Filadélfia…
Ao montar o roteiro, consultei por mera curiosidade a agenda do Guns. Eu já sabia, desde de alguns meses antes, que Slash havia acabado de retornar à banda — algo que parecia impossível, depois de mais de vinte anos de ausência e de um conflito dado como irreconciliável entre ele e Axl Rose. Parecia uma reconciliação mítica essa reunião.
Para mim, durante todo o período em que Slash esteve fora (mais de 20 anos!), o Guns soava como uma caricatura de si mesmo — uma banda cover com o direito de usar o nome original. Mas com Slash de volta, tudo mudava. Agora era o Guns N’ Roses de verdade.
A volta de Slash deu à banda aura de renascimento. Como uma fênix, erguiam-se das cinzas. Foi nesse espírito que lançaram a turnê Not In This Lifetime — “Nunca nesta vida!”. A agenda da banda estava no início, sendo incerto se a reunião se manteria, e eu não tinha a pretensão de coincidir minha viagem com um show justamente na cidade que estava indo.
Até que, conferindo as datas dos shows, veio uma descarga de adrenalina. Haveria um show em Nova York, mas no dia seguinte ao meu retorno ao Brasil. Nem deu tempo de lamentar, porque vi no instante seguinte: dois dias antes da minha partida, haveria um show na Filadélfia, a duas horas de Nova York. No mesmo momento que li, pensei: eu estarei lá!
E assim, dois dias antes de deixar os Estados Unidos, lá estava eu, a caminho da Filadélfia.
Não era só um show: era a chance de viver ao vivo o que incendiara a minha adolescência.


E como aperitivo para aquela noite, passei à tarde diante do Museu de Arte da Filadélfia (ou “Philadelphia” com “ph” para fazer jus àquele retorno ao clássico). A arquitetura do prédio é imponente, bela por si só. Mas eu fui lá para subir a escadaria do Rocky.
A escadaria do Rocky
Cresci com aquela saga de Stallone. Aqueles degraus não eram concreto: eram metáfora de persistência, disciplina e superação. Ali, um homem comum se erguia contra as adversidades da vida. A vitória de quem não desiste mesmo quando tudo parece impossível de alcançar. A própria vida pessoal de “Sly” (como é conhecido Sylvester Stallone), em seu início de carreira, confunde-se com a de seu personagem Rocky Balboa.
Estar naquela escadaria em algum momento da vida não era apenas fazer turismo. Era emoção pura. Ao subir os degraus, cantarolando o tema de Rocky (tã rã… rãaan…), senti o peso da trilha sonora nos meus ouvidos, como se cada passo funcionasse como um lembrete: a vida derruba, mas é você quem decide se vai se levantar.
Afinal, como dizia Rocky:
“Nobody is gonna hit as hard as life, but it ain’t about how hard you’re hit. It’s about how hard you can get hit and keep moving forward. How much you can take and keep moving forward! That’s how winning is done!”
(“Ninguém vai bater tão forte quanto a vida. Mas não se trata de quão forte você pode bater. Se trata de quão forte você pode ser atingido e continuar seguindo em frente. O quanto você aguenta e continua avançando. É assim que se vence.”
E foi impossível não enxergar o paralelo…
Eu também estava tentando me reinventar, buscar novas forças, encontrar meu próprio ringue.




Pisar na escadaria do Rocky, naquela tarde, foi como um prelúdio do que ainda viveria à noite. Um aquecimento da alma para a catarse que estava prestes a acontecer no Wells Fargo Center (hoje a arena multiuso tem o nome de Xfinity Mobile Arena).
O renascimento
Quando entrei naquele imenso ginásio, fui engolido por uma onda de energia. A multidão se espalhava em cada assento, cada espaço da pista. A vibração era palpável, como se o ar estivesse eletrificado. As luzes tremulavam, e mal cheguei ao meu lugar, Duff, o baixista, abria o show com aquele riff inconfundível de It’s so easy.
A plateia explodiu. E lá estavam eles: Duff, Axl e sobretudo Slash, com sua cartola e sua Gibson Les Paul.
Era como se o tempo tivesse se curvado, trazendo de volta o garoto de 15 anos diante de um videocassete, mas agora, ao vivo e a cores.
No palco, o renascimento da banda. Na plateia, o meu.




Um marco que segue vivo
A viagem terminou, mas aquela experiência ficou como um marco. Não foi apenas um show ou a compra de uma guitarra, ou uma simples viagem internacional. Foi um ponto de virada. A Gibson no quarto, as fotos registradas, a memória em cada acorde e ruas visitadas se tornaram lembretes de que os sonhos não desaparecem. Eles amadurecem conosco e, no momento certo, despertam de novo.
E agora, passados os anos, sinto essa chama reacender. Em outubro, terei a chance de assistir ao Guns N’ Roses novamente, desta vez em Florianópolis, a poucos quilômetros de casa.
Não será repetição de um passado. Será continuidade de uma jornada — um reencontro com a música, com a fotografia e com o homem que aprendeu a transformar inquietações em movimento, e movimento em sentido.
Porque, no fim, é disso que se trata: reconhecer as marcas do caminho, honrar quem fomos e seguir em frente, sempre.
A música, a fotografia e o desejo de desbravar o mundo seguem comigo.
Pontes vivas entre o que eu vivi, o que eu sou e o que ainda posso me tornar.


CONVITE
Essa é a minha história. Uma jornada de música, fotografia e viagem que transformou minha vida.
Se ela ressoou em você, te convido a caminhar comigo pelas próximas histórias e reflexões:
📸 Instagram @fotografandomundoafora
▶️ YouTube – Mantovani Clicks


